Cristianismo
Aprendendo com a própria fraqueza
Uma característica importante a todo homem ou mulher de Deus para esta hora, é que não basta que entendamos o drama espiritual no qual estamos imersos, e discernamos a forças que nos desafiam nessa conflitividade. Temos que ser pessoas que também aprendam a respeito de sua própria fraqueza. Ao falarmos do enfrentamento da realidade que nos cerca é importantíssimo saber que não temos ilusões a respeito de quem sejam os intrumentos de Deus para esse tempo. Aprecio muito a descrição que Tiago faz de Elias, quando o aproxima de mim e de você, e quando diz que ele foi um homem para aquela hora, apesar de de ser homem semelhante a nós, sujeito e exposto às mesmas tentações,
Em I Reis capítulo 19, vemos que após Elias haver pregado no monte Carmelo, e ter visto fogo descer, e haver presenciado uma resposta compulsiva do povo, dizendo: "Só o Senhor é Deus"; e depois de haver liquidado os profetas de Baal, fazendo uma espécie de purificação institucional em Israel, nós o encontramos numa escuridão indescritível de alma, apanhado na própria fraqueza. A verdade é que entre os dois capítulos (18 e 19) parece até que há dois personagens diferentes. O Elias do capítulo 18, está no capítuo 19, desvigorado, apavorado, trêmulo, vulnerável ao extremo. A alegria em que estiver, deu lugar a um profundo desânimo existencial. Em I Reis 18:41, nós o vemos incitando o rei a uma celebração, enquanto em I Reis 19:4, encontramos a mesma pessoa, assentado debaixo de um zimbro, pedindo para si a morte.
Há uma diferença gritante entre a atitude existencial de um dia e a postura existencial do outro. Essas manifestações na vida de Elias, mostram como somos sujeitos a uma vulnerabilidade total. Mostra que não somos iguais todos os dias de nossa existência. Mas, demonstram também que a ação de Deus se manifesta através de gente assim - como Elias, você e eu - gente que oscila, ora está lá em cima, ora cá embaixo, ora nas nuvens, ora em abismos existenciais. Aliás, chego mesmo a crer que para que Deus nos use é preciso que sejamos capazes de experimentar depressão, tristeza, e imensa fraquesa. Em outras palavras: é necessário que sejamos humanos. Isso porque a graça só se aperfeiçoa quando encontra nossa real humanidade (II Coríntios 12:6-9). Deus vai usar nesta hora, aqueles que sabem que uma das piores coisas que podem acontecer a um homem/mulher de Deus é ver-se como essencial. Isso fica claro quando Elias repete mais de uma vez, a expressão: "Só eu fiquei" I Reis 19:10. Ou seja, o Senhor não podia contar com mais ninguém, senão ele. Depois no versículo 4, do mesmo capítulo, ele diz: "Basta, toma agora, ó Senhor, a minha alma, pois não sou melhor do que meus pais". Ninguém lhe disse ser ele, melhor do que ninguém; era ele que o dizia a si mesmo. Ele havia desenvolvido uma idéia de singularidade.
Agora acho interessante o modo como Deus tratou Elias, o que serve de lição para nós hoje. Deus não tenta de modo nenhum, adubar a auto-piedade de Elias. Ele apenas procura tirá-lo de si mesmo, da caverna onde se encontra e o devolve à vida. Veja o que está escrito em I Reis 19:15,16: "Vai e volta ao teu caminho, para o deserto de Damasco e, chegando lá, unge a Hazael rei sobre a Síria. A Jeú, ungirás rei sobre Israel, e também Eliseu, ungirás profeta em teu lugar". Não é um tratamento que busca encontrar a vida no seu intimismo; ao contrário, é uma convocação para que a pessoa saia de si e veja o que há para ser feito e construído. Deus encontra Elias nessa depressividade e usa isso a fim de lhe abrir os olhos para que ele veja os fiéis que ninguém via.
A seguir é como se Deus dissesse: Não só estou querendo que me conheças mais profundamente, como desejo que saias daqui e olhe a História, posto que és um ser da História, e não de grutas, e não do intimismo acovardado. Quero também que saibas que não estás sozinho na vida; que a tua sensação de essencialidade é falsa. Pois eu tenho sete mil que não dobraram em hipótese nenhuma os joelhos a Baal. Com excessão do nome de Elias, vemos poucos nomes relacionados ao povo de Deus como o de Obadias e Micaías. Contudo havia uma série de outras pessoas igualmente comprometidas com Deus, que aparecem sem nome no texto. Há pelo menos quatros outros profetas que as Escrituras comentam que tiveram participação importante naquele momento histórico, mas cujos nomes não aparecem, como está registrado no capítulo 20 de I Reis.
Os profetas estavam lá! Não eram identificados, conhecidos, mas estavam lá. E esses profetas anônimos, revelam o fato de que no meio do anonimato da História há milhares de pessoas de Deus que jamais curvam os joelhos à corrupção da vida. Nem todos são chamados a ser como Elias, mas todos são chamados a ser fiéis. Quando olhamos à volta e vemos a negridão de algumas expressões destes dias, sabendo muitas vezes que Deus está também trabalhando e realizando coisas, parece-nos que as outras - as malignas - são em número tão maior, que ficamos chocados, desanimados. É nessa hora que é bom olhar para trás, lembrar que a fé cristã passou pela subversão constantiniana, que tentou corrompê-la; atravessou a lúgubre escuridão da Idade das Trevas, onde não parecia haver luz, nem vislumbre de nada bom no horizonte; enfrentou todas as tentações das ideologias e dos sistemas políticos, e não obstante tudo isso, de algum modo chegou até nós!
É em razão disso, que não é hora de nos encaramujarmos, enrolarmos em nós mesmos, interpretando a História com depressividade. Porque se há uma História para ser vista com depressividade hoje, há também uma história a ser encarada com esperança. Além do mais, tal percepção de que as coias estão más, já é em si mesmo um bom sinal. É sinal de vida. É sinal que a nossa consciência não morreu ainda. É sinal de que apesar de tudo, nós estamos ainda andando para frente. Portanto, se você está na caverna, saia dela hoje, pois saiba, você não está só, o nosso Deus é o Senhor da História.
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