Os dons do Espírito Santo são para hoje? Uma resposta aos cessacionistas - parte 02
Cristianismo

Os dons do Espírito Santo são para hoje? Uma resposta aos cessacionistas - parte 02


Sim eu sou continuísta
 Deixe-me começar com a presença sólida, certamente difundida e inteiramente positiva de todos os dons espirituais por todo o Novo Testamento (NT). Os problemas que surgiram na igreja de Corinto não se deram por conta dos dons espirituais, mas por pessoas imaturas. As advertências de Paulo não se referiam aos dons de Deus mas, sim, à distorção infantil, ambiciosa e orgulhosa da parte de alguns.

Além do mais, começando com o Pentecoste e percorrendo todo o livro de Atos, vemos que toda vez que o Espírito era derramado sobre os novos convertidos, eles experimentavam do seu carisma. Não há nada que indique que esses fenômenos eram restritos a eles e à época. Tais manifestações parecem ser tanto difundidas quanto comuns na igreja do NT. Os cristãos em Roma (Rm 12), Corinto (1 Co 12-14), Samaria (At 8), Cesareia (At 10), Antioquia (At 13), Éfeso (At 19), Tessalônica (1 Ts 5) e Galácia (Gl 3) experimentaram dos dons de milagres e revelação. É difícil imaginar como os autores do NT poderiam ter falado mais claramente sobre como deveria ser o Cristianismo da Nova Aliança. Em outras palavras, o fardo de provar o contrário está com o cessacionista.

Os dons ficaram restritos ao exercício pelos apóstolos?
Gostaria de apontar também a extensa evidência neotestamentária dos chamados dons milagrosos entre cristãos que não são apóstolos. Ou seja, vários homens e mulheres que não eram apóstolos, jovens e anciãos, em toda a extensão do império romano exerciam de maneira consistente esses dons do Espírito (e Estevão e Felipe ministravam no poder de sinais e maravilhas). Aqueles que exerciam os dons miraculosos mas, não eram apóstolos são: os 120 que estavam reunidos no salão superior no dia de Pentecostes, Estevão (At 6,7); Felipe (At 8); Ananias (At 9); membros da igreja de Antioquia (At 13); convertidos anônimos em Éfeso (At 19.6);  mulheres em Cesareia (At 21.8,9); os irmãos de Gálatas 3.5; crentes em Roma (Rm 12.6-8); crentes em Corinto (1 Co 12-14); e cristãos em Tessalônica (1 Ts 5.19,20).

Também temos que dar espaço para o objetivo explícito e frequentemente repetido do propósito dos carismas: nomeadamente, a edificação do corpo de Cristo (1 Co 12.7; 14.3; 26). Nada do que leio no NT ou do que vejo na condição da igreja em qualquer era, passada ou presente, me leva a crer que progredimos além da necessidade pela edificação – e consequentemente além da necessidade pela contribuição dos carismas. Eu confesso livremente que os dons espirituais foram essenciais para o nascimento da igreja, mas por que eles seriam menos importantes ou necessários para o crescimento e amadurecimento contínuos?

Há também a continuidade fundamental ou o relacionamento espiritual orgânico entre a igreja de Atos e a igreja dos séculos subsequentes. Ninguém nega que houve uma era ou período no começo da igreja que chamemos de “apostólica”. Temos que reconhecer o significado da presença pessoal e física dos apóstolos e o seu papel único na formação da fundação da igreja nos primeiros séculos. Mas não há no NT qualquer coisa que sugira que certos dons espirituais eram exclusiva e unicamente ligados a eles ou que os dons se encerraram com a partida deles. A igreja universal ou corpo de Cristo que foi estabelecida por meio do ministério dos apóstolos é a mesma igreja universal e corpo de Cristo hoje. Estamos juntos com Paulo, Pedro, Silas, Lídia, Priscila e Lucas, membros do mesmo corpo de Cristo.

Bem ligado ao ponto anterior é o que Pedro diz em Atos 2, referente aos ditos dons miraculosos como característicos da era pactual da igreja. Como já disse D. A. Carson: “A vinda do Espírito não está associada meramente com o nascimento da nova era, mas com a sua presença, não meramente com o Pentecoste, mas com todo o período do Pentecoste até o retorno de Jesus, o Messias” (em A Manifestação do Espírito, Ed. Vida Nova). Novamente, os dons de profecia e línguas (At 2) não são retratados como mera inauguração da nova era pactual, mas para caracterizá-la (não esqueçamos de que a era atual da igreja equivale aos “últimos dias”).

Devemos também notar 1 Coríntios 13.8-12. Nesse texto Paulo certifica que os dons espirituais não “passarão” (ver v.8-10) até a vinda do “perfeito”. Se o “perfeito” é realmente a consumação do propósito redentivo de Deus tal qual expressado pelo novo céu e nova terra seguindo a volta de Cristo, podemos confiantemente esperar que Ele continue a abençoar e capacitar a sua igreja com dons até aquela hora.

Um ponto semelhante aparece em Efésios 4.11-14. Aqui, Paulo fala de dons espirituais (junto com o ofício de apóstolo) – e particularmente dos dons de profecia, evangelismo, pastoreio e ensino – como construção da igreja “até que todos alcancemos a unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a medida da plenitude de Cristo” (V. 13, NVI – grifos meus). Já que a plenitude de Cristo certamente ainda não foi atingida pela igreja, podemos antecipar com confiança a presença e o poder de tais dons até que aquele dia chegue.

Testemunho consistente
Ao contrário do que muitos pensam, há um testemunho consistente ao longo de grande parte da história da Igreja referente à operação dos dons miraculosos do Espírito. Simplesmente não é verdade que os dons cessaram ou desapareceram da vida no começo da Igreja após a morte do último apóstolo.

Cessacionistas frequentemente argumentam que sinais e maravilhas, assim como certos dons, serviram somente para confirmar e autenticar o grupo original de apóstolos e que quando esses morreram, também cessaram os dons. A verdade é que nenhum texto bíblico ,nem mesmo Hb 2.4 ou 2 Co 12.12, chega dizer que sinais e maravilhas ou certos dons espirituais serviram para autenticar os apóstolos. Sinais e maravilhas autenticaram Jesus e a mensagem apostólica referente a ele. Se sinais e maravilhas foram designados exclusivamente para autenticar os apóstolos, não temos como explicar porque pessoas que não eram apóstolos (como Felipe e Estevão) foram capacitados a exercê-los (ver especialmente 1 Co 12.8-10, onde o “dom” de “milagres”, entre outros, foi dado a crentes medianos, que não eram apóstolos).

Portanto, essa é uma boa razão para ser cessacionista apenas se você puder demonstrar que a autenticação ou testificação da mensagem apostólica era o propósito único e exclusivo de tais demonstrações de poder divino. Todavia, em nenhum lugar do NT o propósito ou função dos milagres ou carismas é reduzido à testificação. O agir miraculoso, em qualquer forma que seja, servia a outros propósitos distintos: doxológico (para glorificar a Deus: Jo 2.11, 9.3, 11.4, 11.40 e Mt 15.29-31); evangelístico (para preparar o caminho para que o Evangelho fosse conhecido: ver At 9.32-43); pastoral (como expressão de compaixão e amor e cuidado com as ovelhas: Mt 14.14; Mc 1.40,41); e edificação (para levantar e fortalecer os crentes: 1 Co 12.7 e o “bem comum”; 1 Co 14.3-5, 26).

Finalmente, apesar de tecnicamente não ser uma razão ou argumento para ser um continuísta, não posso ignorar a experiência. O fato de que eu já vi todos os dons espirituais sendo operados, de ter testado e confirmado e os experimentado em primeira mão em inúmeras ocasiões. Esta não é tanto uma razão para se tornar um continuísta, e mais uma confirmação (apesar de não ser infalível) da validade dessa decisão. A experiência, isolada do texto bíblico, prova muito pouco. Mas a experiência deve ser considerada, especialmente se esta ilustra ou incorpora aquilo que vemos na palavra de Deus.

A pergunta que eu quero responder é esta: "Se os dons espirituais de 1 Coríntios 12: 7-10 são válidos para os cristãos para além da morte dos apóstolos, por que eles estavam ausentes da história da igreja até sua suposta reaparição no século XX? " Minha resposta segue.

Eles não eram mais decididamente ausente. Eles eram, por vezes, menos prevalentes, mas o mesmo poderia ser dito sobre a presença de sinais, prodígios e milagres na história bíblica também. Em qualquer caso, para argumentar que todos esses presentes foram totalmente inexistente é ignorar um conjunto significativo de provas. Depois de estudar a documentação para reivindicações para a presença destes presentes, a conclusão de DA Carson é que "não há provas suficientes de que alguma forma de presentes" carismático "continuou esporadicamente ao longo dos séculos da história da Igreja que é inútil insistir por motivos doutrinários que cada relatório é espúrio ou fruto de atividade demoníaca ou aberração psicológica "( Mostrando o Espírito, p. 166).

A contemporaneidade dos dons espirituais foi defendida, pós-período apostólico, por exemplo, por Justino Mártir (100-165), Irineu (115-202), Teófilo de Antioquia (120-186), Tertuliano (160-220), Novaciano (200-258), Gregório Taumaturgo (213-270) e Hilário de Poitiers (300-368), mas infelizmente, foi renegada pela maioria dos Pais da Igreja do terceiro século em diante como reação aos desvios Montanistas. Apesar disso, há registros da manifestação dos dons espirituais durante a Alta Idade Média e, depois, entre os valdenses, nos séculos 12 e 15; os anabatistas, no século 16; os quacres e pietistas, no século 17; na França, entre os chamados “calvinistas das cavernas”, no século 18; na Finlândia, também no século 18; além de entre os Morávios, na República Tcheca, na mesma época. Nos séculos 18 e 19, há ainda registros na Inglaterra, Rússia, EUA, dentre outros.

A atualidade de todos os dons espirituais, inclusive a glossolalia, foi clara para John Wesley (1703-1791), que a defendeu em carta ao pastor Conyers Midddleton (The Works of John Wesley, volume 10, pp. 54 a 56); foi clara para o célebre batista inglês F. B. Meyer (1847-1929), sobre o qual Spurgeon disse certa vez: “Ele prega como um homem que viu Deus face a face”; e para o pastor R. B. Swan, sua esposa e membros de sua igreja em Rhode Island, EUA, 1875, que receberam, segundo depoimento de Swan, a Glossolalia. E o que dizer dos relatos e/ou experiências próprias de glossolalia registrados nos séculos 18 e 19 por Thomas Walsh, William Doughty, William Arthur, Horace Bushnell, V. P. Simmnos, J. C. Aroolapen e tantos outros?

E 1801, na localidade de Cane Ridge, Kentucky (EUA), cerca de 3 mil crentes, em um acampamento da Igreja Presbiteriana, entraram no que descreveram como “estado de júbilo”, com “centenas falando em línguas sobrenaturalmente” (Dicionário do Movimento Pentecostal, CPAD, 2007, p. 235). A contemporaneidade dos dons espirituais foi clara para o célebre evangelista congregacional Dwght Lyman Moody (1837-1899), que foi o homem que mais ganhou vidas para Jesus no século 19; e foi clara também para o célebre pregador calvinista congregacional David Martyn Lloyd-Jones (1899-1981). Nos dias de hoje, a atualidade dos dons espirituais é aceita por calvinistas como Wayne Grudem, J. I. Packer, John Piper, Craig Keener, D. A. Carson, Mark Driscoll, C. J. Mahaney, Tim Keller, Sam Storms, Matt Chandler, Vicent Cheung, James MacDonald, Matt Slick, James K. A. Smith, Johanes Lilik Susanto e Paul Walsher.

O pastor George Wood, líder da Assembleia de Deus nos EUA e do Comitê Mundial das Assembleias de Deus, publicou um artigo que resume tudo: “Dr. MacArthur acredita que os dons miraculosos do Espírito cessaram com o fim da Era Apostólica e que os movimentos pentecostais e carismáticos [ou seja, renovados e neopentecostais] são, portanto, teologicamente aberrantes em um nível fundamental. Por outro lado, cristãos pentecostais e carismáticos acreditam que “a promessa [isto é, o dom do Espírito Santo] é para vós e vossos filhos e para todos os que estão longe, para todos aqueles que o Senhor nosso Deus chamar” (Atos 2.39). Com essa promessa, vem o sinal comprobatório de falar em outras línguas (Marcos 16) e o poder para ser testemunha de Cristo ‘até os confins da terra’ (Atos 1.8; 2.4; Lucas 24.49). Logo, seguindo o ensino do apóstolo Paulo, procuramos com zelo os dons do Espírito Santo (1 Coríntios 14.1)”.
O anglicano John Stott (A Mensagem de Atos, p. 70,71) falando sobre as línguas em I Coríntios, diz que “elas são um dom espiritual que continua sendo outorgado a alguns para edificação própria e para edificação da igreja”. O pastor presbiteriano Hernandes Dias Lopes complementa: “As línguas em I Coríntios, por serem um dom espiritual concedido à igreja pelo Espírito Santo, continuaram. A última palavra que Paulo tem sobre o assunto é: ...e não proibais o falar em outras línguas, I Co l4:39”, (Atos, p. 58).

 

 



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