3.3 aquele que não voltar a nascer, não pode ver o Reino de Deus. Cristo obviamente não estava falando de reencarnação (como alegam os espíritas), o que implicaria em uma interpretação excessivamente literal do verso, que iria contra o sentido do mesmo, já que ele implica que nem todos nascem de novo, uma vez que nem todos entram no Reino de Deus. A ênfase naquele que volta a nascer mostra que existem pessoas que não nascem de novo, e, consequentemente, o texto não pode estar se referindo à reencarnação, já que nesta doutrina espírita todos nascem (literalmente) de novo, independentemente se creem em Cristo ou não, se são bons ou maus, se veem o Reino de Deus ou não. Para entender o verso é necessário voltar à criação, quando Deus criou tudo perfeito, mas o pecado entrou no homem por meio de seu livre-arbítrio, tornando-o totalmente depravado, ou, em termos espirituais, morto (v. nota em Ef.2:1). Por isso, Deus precisa derramar sua graça preveniente sobre o indivíduo, resgatando seu livre-arbítrio espiritual e o tornando apto para escolher entre aceitar ou rejeitar a graça divina. O que ocorre depois da aceitação é a regeneração, que também é conhecida como novo nascimento, que Cristo falava aqui. A pessoa não nasce fisicamente de novo no mundo físico, mas nasce espiritualmente de novo no Reino espiritual. Aquele que estava morto reviveu; estava perdido mas foi achado (Lc.15:32). A partir de então, Deus lhe dá fé e o Espírito Santo, possibilitando que a pessoa siga a caminhada cristã até o fim. Sem essa regeneração (novo nascimento), é impossível que aquele que teve conhecimento de Cristo durante a vida entre no Reino de Deus, e nem mesmo “olhe” para ele (v.3).
3.4 pode ele voltar a entrar no ventre de sua mãe, e nascer? Jesus estava falando sobre “nascer de novo” espiritualmente (v. nota anterior), mas Nicodemos incorretamente entendeu que Cristo estivesse falandoliteralmente (sobre nascer de novo fisicamente). Fatos semelhantes a este ocorreram várias vezes no Evangelho de João. A mulher samaritana do poço entendeu que Jesus estivesse falando de água literal, quando as “águas vivas” deviam ser entendidas espiritualmente (Jo.4:15), e os judeus pensaram que Cristo estivesse falando sobre literalmente comer sua carne e beber seu sangue em Jo.6, quando o que estava em jogo era a verdade espiritual sobre ter parte com Cristo (crendo nele) ou não ter parte com ele (rejeitando-o).
3.5 da água e do Espírito. I.e, por meio do batismo nas águas e do arrependimento. Embora o batismo não salve, ele é parte importante na fé cristã, e rejeitá-lo deliberadamente sabendo que o certo é batizar-se implica em condenação (evidentemente isso não se aplica a pessoas que não puderam batizar-se, seja por não ouvirem falar do batismo ou por terem se convertido no final da vida, como é o caso da ladrão da cruz). O “nascer do Espírito” refere-se à obra do Espírito Santo no coração do homem, que começa no arrependimento. Sem arrependimento não há salvação (Lc.13:5), e o fruto do arrependimento é a santidade, “sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hb.12:14).
3.6 o que é nascido de carne, carne é; e o que é nascido do Espírito, espírito é. Jesus não estava dizendo que a pessoa feita de carne se transforma imediatamente em um “espírito” ao crer, mas reiterando a mensagem de que aquele que renasce espiritualmente vive para agradar o Espírito Santo, enquanto aquele que não nasceu para Deus ainda está morto em pecados e vivendo para agradar a sua própria carne, isto é, seus desejos carnais e pecaminosos que dominam o coração do homem naturalmente depravado.
3.8 assim é todo aquele que é nascido do Espírito. Aquele que é regenerado espiritualmente pode não entender plenamente as ações de Deus em sua vida, sobre como ele age ou por que ele fez isso e não aquilo, mas descansa na soberania divina sabendo que Ele está no controle de todas as coisas e que “tudo coopera para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm.8:28).
3.13 ninguém subiu ao céu. Embora muitos interpretem que Jesus estava dizendo que literalmente nenhuma pessoa havia subido ao Céu, o mais provável pela conjunção "e" (καὶ), que liga este verso ao anterior, é que Cristo estava apenas ressaltando o conteúdo primordial do verso 12, que contrasta as "coisas terrenas" e as "coisas celestiais". Cristo, portanto, é o único que podia falar das coisas celestiais, ao passo em que ninguém mais tinha tal autoridade. O que reforça esse entendimento espiritual do verso em relação à tese literalista é todo o contexto espiritual da conversa com Nicodemus e também o fato de que o verso não diz apenas que "ninguém subiu ao céu", mas sim que "ninguém subiu ao céu, exceto o Filho do homem", e Jesus não tinha subido ainda (só havia descido).
3.13 que está no céu. Trata-se de um acréscimo espúrio que não está presente nos melhores e mais antigos manuscritos bíblicos. Várias versões (como a NVI e a Almeida Atualizada) omitem totalmente esta parte, enquanto outras (como a Almeida Revista e Atualizada) acrescentam este trecho entre colchetes, por se tratar de um “texto duvidoso”. Jesus, enquanto dizia aquilo, não estava no céu, mas na terra.
3.14 assim deve o Filho do homem ser levantado. I.e, ressuscitar dentre os mortos.
3.16 Este é certamente o versículo mais conhecido e central de toda a Bíblia. Ele nos mostra, em primeiro lugar, que Deus não ama apenas parte da humanidade, mas o mundo inteiro. No Evangelho de João, nunca a palavra “mundo” significa “apenas os eleitos”, mas sempre aparece como referência ao mundo inteiro ou ao mundo perdido. Em segundo lugar, ele mostra que foi por este “mundo” (i.e, por todos os perdidos) que Deus enviou seu Filho unigênito, e não somente “para os eleitos”. Foi certamente uma expiação universal, e não meramente uma expiação limitada. Deus amou o mundo de tal maneira que decidiu dar uma oportunidade de salvação a todos, e não somente para alguns. Ele deseja que todos sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade (v. nota em 1Tm.2:4). Finalmente, o texto nos mostra que nem todos serão de fato salvos, mas somente “todo aquele que nele crê”, e estes herdarão uma vida eterna. Aqueles que não creem não serão salvos (como ensinam os universalistas) e não terão uma vida eterna no inferno (como ensinam os imortalistas), mas simplesmente perecerão – que é um dos 27 diferentes substantivos utilizados na Bíblia para descrever no aniquilamento dos ímpios (v. nota em 2Pe.2:6).
3.17 não mandou seu Filho ao mundo para que condenasse ao mundo; mas sim para que o mundo por ele fosse salvo. I.e, a intenção não era de salvar alguns e condenar outros, mas de salvar todo o mundo, o que só seria possível através de uma expiação ilimitada. Aqueles que se perdem não se perdem em função de Deus não ter feito nada em relação a eles ou de ter recusado enviar seu Filho unigênito para morrer por eles, mas sim porque rejeitaram deliberadamente servir àquele Deus que tanto os amou.
3.18 já está condenado. A condenação futura nada mais é senão um veredicto justo daquilo que cada um escolheu fazer nesta vida. Aqueles que creem em Jesus estão neste momento salvos, ao passo em que aqueles que não creem estão neste momento condenados, antes mesmo do juízo final definir isso de forma pública e definitiva.
3.20 para que suas obras não sejam reprovadas. Isso mostra que a razão de muitos rejeitarem o evangelho não é porque intelectualmente não o achem razoável, e a razão de muitos não crerem em Deus não é por terem evidências conclusivas de que Ele não exista, mas somente porque isso lhes é mais conveniente, para que possam continuar vivendo no pecado sem se sentirem culpados com isso, já que no ateísmo não há padrões morais objetivos, como há no cristianismo. A razão pela qual eles não vem à luz não é pela falta de luz ou pela falta de evidências da luz, mas pela falta de disposição em aceitar as consequencias disso, que inclui o abandono dos pecados e a rejeição às suas más obras. O ateísmo, para muitos, nada mais é senão um sistema onde a pessoa pode fazer o que quer sem se sentir culpada por nada, assim como vivem muitos cristãos não-praticantes, que na prática não se diferenciam em nada dos ateus.
3.23 porque havia ali muitas águas. Isso mostra que o modo principal de batismo deve ser por imersão, e não por aspersão. João Batista fez questão de ir procurar um lugar onde houvesse muitas águas para batizar (o que é totalmente necessário para o batismo por imersão), ao invés de se conformar com qualquer lugar que tivesse pouca água (como ocorre no batismo por aspersão, onde o padre ou o pastor não precisa de muita água para aspergir sobre o batizado). Tal exigência de João seria absolutamente desnecessária caso o batismo fosse meramente o aspergir de água que não exigisse uma quantidade grande dela, e o fato de ele se preocupar em encontrar um lugar com muita água revela que o batismo de João era por imersão, onde se faz necessário encontrar um lugar com bastante água. De fato, a própria palavra “batismo” (baptizo) já define a questão, pois significa “imergir em águas” (Strong, 907). O batismo é “um rito de imersão na água, como ordenada por Cristo, pelo qual alguém, depois de confessar seus pecados e professar a sua fé em Cristo, tendo nascido de novo pelo Santo Espírito para uma nova vida, identifica-se publicamente com a comunhão de Cristo e a igreja” (Strong, 908). Assim, perguntar se o batismo é por imersão é tão sem necessidade quanto perguntar se a chuva é molhada, se subir é pra cima e se descer é pra baixo, pois a imersão faz parte da essência e do próprio significado da palavra batismo.
3.30 ele convém crescer, porém a mim diminuir. Esta deve ser a mentalidade de todo e qualquer verdadeiro cristão. Nós não temos que procurar a fama, o sucesso ou estar em evidência, mas sim que Cristo esteja em evidência através da nossa vida. O sucesso que João Batista tinha entre os judeus não era para colocá-lo em foco, mas para colocar Cristo em foco, para apontar ao Messias. Agora que Jesus já iniciara seu ministério terreno, convinha que João “diminuísse”, isto é, deixasse de ser o centro das atenções, já que seu objetivo de evidenciar a pessoa do Messias já havia sido cumprido com êxito. A mesma coisa nós devemos fazer em nossa vida. Não devemos “crescer” para colocar nós mesmos em evidência. Devemos diminuir o nosso “eu” e fazer com que as pessoas vejam Cristo através de nós, e que a toda a glória e a honra não seja voltada para nós mesmos, mas direcionada para aquele a quem pregamos – Cristo Jesus. Se Deus permitiu que algum pregador se tornasse mais conhecido, o objetivo deste pregador deve ser sempre o de que as pessoas conheçam a Cristo e tenham comunhão com Ele, ao invés de ser o de se promover ou de colocar o seu próprio nome ou de sua denominação em evidência.